segunda-feira, 5 de janeiro de 2009

O Jogo da Minha Vida, por Fabricio

NBA nunca foi para todos. Nos anos 80, acompanhar o melhor basquete do mundo era uma aventura. Vídeo, jornais, revistas, lojas especializadas... Tinha alguns amigos fanáticos, e comecei a olhar diferente para o esporte. Já nos anos 90 - e ainda sem internet, TV a cabo, ESPN ou SporTV - a Liga Americana começou a passar na Band. Duas, três, quatro, seis vezes por semana, invariavelmente na madrugada, arregimentaram uma legião de fãs, que passavam as madrugadas em claro acompanhando os lances incríveis de feras das quadras e dividiam sua torcida entre as franquias.

Mas havia uma em especial, com um certo jogador em especial, que transformou os touros de cidade fria e decadente no Flamengo do basquete. Todos queriam um boné, uma camisa, dos rubro-negros do Chicago Bulls. Pobres eram aqueles que torciam pelos rivais. E eu era um desses. E os poucos sofredores que passaram alguns anos dormindo pouco e quicando bolas por aí tiveram um momento épico na temporada 95/96. Um time instável, que jogava um basquete com raça e contava com um dos melhores defensores da história estava a um passo de fazer história: Seattle Supersonics.

Após uma surra no 1º e uma noite dramática no 2º, a série de sete jogos se mudou para a então capital do grunge. Mais uma surra dos visitantes no Key Arena e um 0 a 3 ameaçava transformar tudo em um enorme fiasco. Os donos da franquia, que haviam vendido todos os bilhetes para os três jogos, já faziam as contas para devolver o dinheiro do público. Tensão no ar. Eis que surge Nate McMillan (última foto) para o quarto jogo. E o ginásio vem abaixo, empurrando os Supersonics para uma histórica vitória sobre o todo-poderoso rival. A série estava 1 a 3: era uma missão impossível.

Quinto jogo. Junho. Key Arena lotada. E a sala da casa do grande amigo Eduardo também. Uns 30 moleques se acotovelavam pra torcer pelo provável campeão. E outros 3, contra. Gary Payton estava em quadra. Shawn Kemp (acima na foto) e Detlef Schrempf (abaixo) também. McMillan, Hawkins, Perkins e Brickowski, prontos. Seria uma batalha. A torcida empurrava e as superestrelas visitantes tentavam jogar. Mas, na raça, os donos da casa não deixavam. George Karl, técnico barbudo e com jeito de Bernardinho, gritava, organizando o rodízio sobre o Rei. Dois, três, zona, pressão... E o Rei não jogava. Seus arautos pareciam perdidos em quadra. Por Payton ninguém passava. Schrempf acertava tudo de três. E a camisa 40 de Kemp parecia ter asas.

Primeiro quarto: empate em 18. No segundo e terceiro, virtuais empates. Veio o decisivo período. A determinação era matar ou morrer. 'Take no prisioners', nada de prorrogação. Kemp, Payton e Detlef entenderam. O Supersonics acertava tudo. Pegava todos os rebotes. Não dava espaços. Sufocava. O Rei colocava as mãos nas cadeiras. Seus arautos olhavam, se apequenavam e entendiam. 'Não era hoje'. No último quarto, um massacre e o placar final: 89 a 78. Davi ia vencendo Golias. Era apenas a segunda vez, em cem jogos, que os queridinhos perdiam dois jogos em sequência.

Na sala, aqui no outro hemisfério, três comemoravam, como se tivessem cortado lenha nos arredores da fria capital de Washington por toda a vida. Os Supersonics vibravam, corriam e pulavam pela quadra, a torcida gritava e chorava no Key Arena. Os bonés rubro-negros cobriam rostos cheios de espinhas. A 'pelada' na quadra do colégio, no dia seguinte, nunca foi tão desanimada.

No fim, Davi não venceu Golias. Mas nem precisava. Estávamos vingados e, por 48 horas, o Rei estava morto.

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O belo e emocionante texto é de Fabrício Yuri Vitorino e lembra a vitória do Seattle sobre o Chicago Bulls por 89-78 no jogo cinco das finais da temporada 1995-1996 (imagem aqui). Naquele jogo, Gary Payton anotou 23 pontos, Shawn Kemp outros 22 e os Sonics conseguiram estender a série até o sexto jogo, onde o Chicago Bulls, de Michael Jordan e Pippen sagrou-se campeão após vitória por 87-75 (Rodman apanharia absurdos 19 rebotes neste dia). Ótima memória mesmo!

7 comentários:

Anônimo disse...

Otimo texto e me lembro bem dessa final,embora sem a riqueza de detalhes!
Essa epoca e capaz de provar a algumas pessoas que (injustamente) debocharam do final de carreira do Gary Payton o grande jogador que ele foi. Alguns,me lembro dos embates no "Rebote", nem tiveram a oportunidade de ve-lo em se auge e tomavam seus ultimos dias como um sentenca de mediocridade. Ledo engano!Fabricio e,penso,Fabio,nao me deixam mentir.Em seu apice Gary Payton chegou muito perto de ser o maior armador da NBA.Nao chegou tao longe pois foi contemporaneo de um tal John Stockton.Mas eh grande lembranca.Um armador que defendia como ninguem e atacava ferozmente.
Ironicamente,naquela temporada com seus menos de 10 pontos de media,reserva e ja sem pernas,temporada 05/06,coube a ele aquela bandeja milagrosa que explodiu a American Airlines Arena.
Grande Gary Payton!!!

fábio balassiano disse...

concordo, em parte com vc, gabriel. comentava agora com o fabricio, autor do texto, que o payton era realmente fantástico.
perto de ser o melhor da nba é exagero, ao meu ver, mas foi mto bom vê-lo em quadra.
o magic, o oscar robertson, o stockton estão um pouco na frente dele mesmo.

mas, de todo modo, o cara foi um monstro, bem como o kemp.

abs, fábio

Anônimo disse...

Nao nao Fabio!Talvez tenha me expressado mal.Mas eu me referi a um periodo especifico.Nao o maior da historia!!De forma alguma!jamais colocaria na mesma sentenca Payton,Magic,Robertson.
Eu penso que ele chegou perto de ser o maior da sua geracao e esbarrou em Stockton que veio um pouco antes mas estava no seu auge quando o "The Glove" surgiu.

fábio balassiano disse...

aí sim, caro gabriel.
ele e stockton podem, sim, frequentar o mesmo hall...

abs, fábio

Anônimo disse...

Bons tempos de basquete nas madrugadas da Band... Mas se for para escolher os melhores, sem dúvida os playoffs entre Bulls e Jazz eram de pegar fogo!

Anônimo disse...

Fabio, minha maior lembrança dessas finais foi o Rodman tirando o Brickowski do sério...num lance livre ao invés do Rodman ficar virado para o garrafão, como seria normal, ele ficou virado para o Brickowski, encarando ele....o cara ficou muito P da vida....

fábio balassiano disse...

paulorj, é verdade mesmo. o rodman deixou o cara doidinho...
mto bom vc lembrar disso!
o rodman jogou demais nessas finais, demais mesmo.
ele ainda conseguiu limitar o kemp, coisa que a gente por vezes esquece.

abs, fábio