
Pepu Hernández completa, nesta quinta-feira, 53 anos. Pela primeira vez no Brasil, ele está em São Paulo, onde ministra clínica para jovens jogadores (hoje é o último dia, aliás), ele vive uma situação inusitada: pela primeira vez em sua carreira fica tanto tempo longe de um clube ou de uma seleção. Nada que assuste este madrilenho, que em 2006 levou a Espanha ao título mundial. Por telefone e esbanjando simpatia, Pepu conversou com o Bala na Cesta.
-- BALA NA CESTA: Como está a clínica em São Paulo? O número de treinadores está dentro do que você esperava?
-- PEPU HERNÁNDEZ: Estou gostando muito, de verdade. Os jovens demonstram u

ma enorme vontade de aprender, escutam tudo com muita concentração e têm uma energia incrível. Sobre a questão dos técnicos eu não posso falar, porque não vim com expectativas. Mas há treinadores por aqui que acompanham tudo, e depois de cada treino eu vou lá e troco uma idéia com eles. Eles são muito receptivos e têm um desejo muito grande em trocar informações e compartilhar as suas experiências. Acho que isso é uma boa notícia, não?
-- E como tem sido este contato? Você consegue detectar alguma característica especial nas conversas.
-- Sim, consigo. Quase todos me perguntam sobre a formação de jogadores e a maneira como trabalhamos com os jovens – duas grandes características da escola espanhola nos últimos anos. Tenho a mesma impressão que possuía antes de vir para cá: o Brasil tem uma tradição imensa no basquete, passou recentemente por um período não muito brilhante, mas tenho certeza que em breve vocês figurarão de novo no primeiro escalão da modalidade porque têm um potencial muito grande (não só com os atletas, mas nas comissões técnicas também).

-- Mas e então, como se dá essa formação dos atletas? Muito se fala sobre a capacidade da FEB em capacitar técnicos e jogadores.
-- A Federação é a mãe de tudo isso, sem dúvida. É ela quem dá todo o suporte necessário, mas sem os clubes o basquete espanhol não seria nada. Nada! Falo das agremiações da ACB, das LEB’s (Ligas de Acesso) e das divisões de base. Reduzir o trabalho dos clubes a um “ah, a FEB é excelente” seria cruel e injusto. São os técnicos das divisões inferiores que formam os atletas no dia a dia, que ralam muito e que desenvolvem os jogadores para que os técnicos de seleções os escalem depois. Posso te garantir que quase todos são incrivelmente competentes, determinados, estudiosos, disciplinados e cientes de suas responsabilidades. Sei disso porque fui um destes técnicos de times principais, e se não fosse a turma do Barcelona que lapidou o Pau Gasol na juventude, eu não o teria dirigido em 2006...

-- Mas a formação é importante, não? Os “produtos” que vemos na ACB e NBA são incríveis...
-- Sim, são inacreditavelmente bons. Mas são os produtos finais de um trabalho muito meticuloso dos clubes. Sobre a formação, bem, para mim o mais importante para mim é a inteligência para atuar em uma quadra de basquete. Acho que essa é uma qualidade que a grande maioria dos espanhóis, hoje, possui. É só ver os freqüentes elogios que os irmãos Gasol recebem em relação a isso na NBA. Creio que potencial físico, técnica, habilidade e domínio dos fundamentos sejam importantes, mas, para mim, tudo isso é “ensinável”. Você pode ajudar um jogador de 20 ou 35 anos a passar, mas não pode fazer muita coisa com um que não entende o jogo. E entender o jogo não é simplesmente entender do aspecto de quadra, mas dele como um todo. Entender, por exemplo, que ele, atleta, é importante para o time, que o time é importante para ele e que, no final das contas, os dois crescem ao mesmo tempo. Isso é fundamental. Por isso considero que, na formação, o essencial é ensinar o jovem atleta a pensar, e não dizer o que ele tem que fazer o tempo todo. Quanto mais capacidade “intelectual” ele possuir, mais chances ele terá de aproveitar o que a quadra lhe proporciona.

-- Mudando um pouco de assunto. Você acabou ficando muito marcado pelo título Mundial com a Espanha, em 2006. Como foi dirigir aquele time, e chegar ao lugar mais alto do pódio?
-- Tenho muito orgulho do título do Mundial, mas também do vice-campeonato europeu do ano seguinte. Pode parecer pouco para o público, mas conseguir um ouro e uma prata em anos seguidos não é fácil. E é por isso que me orgulho de fazer parte de uma geração tão vitoriosa. A expectativa era muito alta quando assumi, e tinha medo que a parte psicológica jogasse contra nós. Mas aquele grupo foi aquele que, sob meu comando, mais perfeitamente conjugou algumas características importantes: preparação adequada, comprometimento, atitude altruísta, excelência técnica e espírito de luta. Fomos, realmente, uma grande equipe.
-- A sua saída da seleção foi um pouco confusa, não?
-- Sim, foi. Mas o fato é que havia comunicado, em 2007, que deixaria o comando da seleção ao final das Olimpíadas porque queria um ano de descanso antes de voltar a dirigir um clube. A Federação Espanhola, no entanto, não pensou assim e começou a procurar o seu caminho. Conforme disse a amigos, trabalhar com a seleção durante dois ou três meses é excelente. São os melhores jogadores, a melhor estrutura, os melhores tudo. O problema são os outros nove ou dez meses do ano, em que você precisa lidar com os dirigentes...

-- E o seu futuro, como está?
-- Depois que saí da seleção, em 2007, me prometi um ano de descanso com a família, e eu cumpri isso. Mas na verdade achei que estaria trabalhando nesta temporada, o que, na realidade, acabou não acontecendo. Houve alguns convites de seleções, mas quero mesmo é voltar a dirigir clubes, ter o contato diário com os atletas. Seleção é muito bom, mas são apenas três meses trabalhando. Para quem é viciado em desenvolvimento de jogadores é muito pouco.