
No dia 15 de março Marlon Louzeiro (cuja irmã Marlianne atua no Casper Junior College) saiu de quadra e foi direto chorar nos vestiários. Trancou-se em seu escaninho e viu as lágrimas descerem de forma feroz. E não era pela derrota da sua Universidade, a Arkansas Little Rock, para North-Carolina Asheville por 81-77 na prorrogação da partida válida pelo Torneio Nacional (o famoso “March Madness”). Com problemas de saúde, seu avô vivia problemas no Maranhão e o pivô de 23 anos e 2,03m não tinha como ajudar. Era um filme que se repetia (ele perdeu três parentes próximos desde que por lá chegou). Nos EUA desde os 17 anos, Marlon (12,3 minutos, 3,4 pontos e 2,6 rebotes nesta temporada) ainda não pisou no Brasil desde que se despediu de familiares e amigos com um único objetivo: vencer em sua vida fora do país. Formado em Educação Física e cursando Comunicação, o maranhense, filho de um segurança de casa noturna e uma funcionária de escola pública, superou a infância bem humilde (“comigo sempre foi tudo muito sofrido, contado, mas nunca passei fome”) e hoje brilha no deserto de Arkansas. Ele abre a seção
“Bye, Bye Brasil” do Bala na Cesta.
BALA NA CESTA: Como um jovem nascido numa família humilde do Maranhão foi parar no meio do deserto de Arkansas?
MARLON: Nossa, minha vida começou muito cedo no basquete. Aos 10 anos estava dentro da Escolinha do Moto Clube com o técnico Leal, mas por dificuldades financeiras eu tive que parar de jogar. Minha mãe e meus avós ainda tentaram ajudar (nessa época meu pai acabara de perder o emprego em uma fábrica local), mas não foi possível continuar naquele momento. Somente aos 14 anos voltei a jogar em uma colônia de férias do Maranhão. Conheci um treinador chamado Carlão (Carlos Tinoco Silva), que fez uma pergunta que mudou minha vida. Ele disse: “Você gosta de basquete? Então não desista”. Respondi que sim e jamais desisti. Fiquei quatro anos em São Paulo, e você deve imaginar como é complicado sair do Maranhão para a maior metrópole do país. Era um menino humilde e tímido numa cidade imensa. Não foi fácil, mas aprendi a me virar e aos poucos as coisas foram acontecendo. Até que recebi o convite para vir estudar nos EUA. Tive apenas um dia para me despedir dos meus familiares e namorada e estou aqui há quase sete anos sem vê-los. Tinha muito medo, mas minha vontade de vencer sempre superou isso tudo. Agradeço desde já ao Walter Roese (agora assistente-técnico da Universidade do Havaí), que me ajudou muito desde que por aqui cheguei.
-- Vindo de uma família muito humilde, foi muito diferente para você chegar para jogar em Junior College nos EUA? A estrutura, a língua, os treinos, tudo é muito diferente, não?
-- Tudo é diferente por aqui, cara. Quando cheguei aqui para jogar no Junior College (Midland College) fiquei assustado com o que a garotada tem em termos de estrutura. Ginásio, comida, hábitos, vestimenta, tudo é muito incrível. Eles fazem as coisas com prazer e uma paixão enorme. Isso é fascinante. Nos primeiros dois anos entender todo este processo foi complicado, pois além da barreira cultural eu tinha o problema da língua. Você pode imaginar como foi difícil me comunicar apenas com gestos e sinais (não sabia nada de inglês). Durante seis meses fiquei louco, chorava muito, até que liguei para o Roese e disse que não agüentava mais. Depois de conversar com ele rezei um pouco e pedi paciência. Pensei em meus familiares e amigos, e sabia que se voltasse assim, sem ter tentado, estaria desapontando a eles. Por isso me mantive, mesmo sofrendo horrores e transparecendo isso (meu técnico chegou a dizer que entendia meu sofrimento). Ali fiquei mais confortável e meu talento começou a aparecer, com atuações defensivas muito boas. Foi esse prazer de competir em alto nível no basquete americano que tirei como exemplo para eu nunca desistir dos meus sonhos.

-- Qual a expectativa individual e para o time em relação à próxima temporada? Voltar para o torneio nacional é o objetivo, certo?
-- Eu fiquei um ano sem jogar (redshirt, como os norte-americanos chamam) e minha experiência como calouro foi muito boa. Tive uma produção sólida e consegui ajudar o time a chegar ao título da Sun Belt Conference. Comecei no banco, mas como jogador defensivo no garrafão eu me saí muito bem. Minha expectativa para o próximo ano, o último em Arkansas Little Rock, é de tentar colocar meus números de rebotes e pontos um pouco maiores e ficar bem melhor fisicamente. Este ano foi uma experiência pra mim como jogador, e tenho certeza que no próximo serei mais cobrado pela comissão técnica. Por ser meu último ano, minha obrigação é ser exemplo para os jogadores que estão chegando e se conseguirmos voltar ao Torneio Nacional, melhor ainda.
-- Mesmo atuando fora do Brasil há muito tempo, você sente vontade de atuar pela seleção brasileira? Gostaria de ser lembrado e atuar pelo seu país?
-- Sim, gostaria muito de ser lembrado para a seleção. É um grande sonho jogar pelo meu país e também poderia representar o Nordeste e o meu Estado (o Maranhão). O basquete da nossa região precisa de ajuda, porque acho que há muitos talentos por lá. Gostaria de chegar à seleção também para ser um exemplo e uma motivação para essa molecada que luta por oportunidades por lá. Acho que nunca o Maranhão teve um jogador na seleção masculina (sei da Iziane entre as meninas), e se conseguisse isso seria um presente para o povo de lá, que sei que ama basquete.
-- Depois de se formar, o que você planeja para a sua carreira? Pretende continuar no basquete?
-- Bem, vou dizer uma frase que minha família me ensinou quando era garoto: “O dia de amanhã a Deus pertence”. Mas tenho planos de terminar meu mestrado aqui nos EUA. Depois que me formar penso em continuar jogando, porque jogar basquete é uma paixão muito forte. Acho que o basquete é minha primeira mulher (risos). Sinto-me muito bem jogando basquete e quando estou em quadra apenas penso em jogar bola e me divertir. Sou outra pessoa em quadra.
BATE-BOLA 
Uma frase: “Deus, sempre acompanhe meus passos”
Uma palavra que odeio: Traição
Um ponto que tenho que melhorar em quadra: Minha regularidade
Uma qualidade fora de quadra: Amigo
Um defeito: Me preocupo demais
Uma mania: Fazer tudo perfeito
Um sonho: Vencer na vida.
Uma cidade: São Luís
Um ídolo: Eminem
Um lugar: Maranhão
Uma comida: A da minha família
Quando penso no Brasil, penso em: Oportunidades pras pessoas
Das coisas do Brasil, sinto mais falta da: Comida
Um livro: O segredo
Um filme: Homens de honra
Uma música: Dias de luta, Dias de Glória (Charlie Brown)
Um amigo: Carlos Tinoco Silva (Carlão)
Um momento triste: Perder meus avós e não poder estar lá com eles
Um momento feliz: Quando fui campeão aqui nos EUA
Um técnico: Walter Roese